sexta-feira, 20 de junho de 2014

Chuva de prata de Santa Cruz

O que fim levou de hoje é sobre uma chuva de prata de que prata não teve nada. Uma chuva de elementos poluidores que prejudicou muito os moradores de Santa Cruz. A Band cobriu muito bem o caso e com certeza os ouvintes fiéis se lembram e o Boechat, que me recomendou correr atrás, também. Foram dois acidentes causados pela CSA – a Companhia Siderúrgica do Atlântico, uma mega siderúrgica lá na Zona Oeste. Vamos entender o que é mega. A CSA é uma parceria entre o grupo alemão ThyssenKrupp e a brasileira Vale do Rio Doce que ocupa uma área de 9 Km2 e é o maior investimento privado dos últimos 10 anos no Estado do Rio de Janeiro. Ela tem capacidade para fabricar até 5 milhões de toneladas de aço por ano e toda a produção é direcionada para unidades do Grupo no exterior, visando atender a clientes no mercado internacional de aço de melhor qualidade para as indústrias automotiva, da linha branca (os eletrodomésticos), e também tratores, guindastes e escavadeiras.

Agora vamos entender a chuva de prata que não foi de prata. No dia seguinte à inauguração da siderúrgica, em junho de 2010, as casas da região amanheceram cobertas de um pó prateado. Em agosto a empresa foi multada em R$ 1,8 milhões pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente. Em dezembro aconteceu outra Chuva de prata, quando foi inaugurado o alto forno. Nova multa, também de milhões de reais.

O que tinha nesse pó prateado? A Secretaria de Meio Ambiente não teve tempo de me responder. Sabe como é que é, Copa do Mundo, feriado, né. Mas eu tive acesso à Resolução 195 da SEA. E nela diz que o pó prateado é tóxico e contém elementos químicos como Zinco (Zn), Silício (Si), Sódio (Na), Manganês (MG), Potássio (K), Cálcio (Ca), Carbono (C), Alumínio (Al) e outros elementos como Vanádio (V), Titânio (Ti), Enxofre (S), Chumbo (PB), Fósforo (P), Níquel (Nem), Magnésio (Mn), Cobre (Cu), Cromo (Cr) e Cádmio (Cd). Nesse relatório, a SEA reconhece ainda que o pó pode causar asma, câncer de pulmão, problemas cardiovasculares, defeitos congênitos e morte prematura. O relatório ainda afirma que levantamentos da própria Secretaria já teriam constatado o aumento no número de queixas dos moradores de Santa Cruz com relação a doenças respiratórias como asma, bronquite e doenças dermatológicas , além de doenças oftalmológicas (conjuntivites), fadiga e estresse e relatos de pioras nos casos de hipertensão e diabetes após exposição a essa poeira de partículas químicas.

Nós conversamos com a Cláudia, presidente da Associação de Moradores do bairro São Fernando, bem próximo ali da Siderúrgica, e ela me disse que a situação hoje é de relativa tranquilidade. Também puderam né, quatro anos se passaram. E, vamos combinar, as pessoas são pobres, são trabalhadores humildes, pescadores e só encontraram para brigar por eles a Defensoria Pública e já vamos falar sobre isso.

Todo mundo demorou. Até a Fiocruz. Um médico da Fiocruz, Dr. Hermano Albuquerque de Castro, pneumologista, pesquisador titular da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca que integra a Fundação, o Dr. Hermano atendeu e acolheu a população que procurou o ambulatório de doenças ocupacionais e ambientais da instituição, na época. Vamos ver o que disse ele no relatório que escreveu sobre os atendimentos que fez:

“A Fiocruz recebeu moradores residentes próximo a esta fábrica, com diferentes queixas de saúde. Os encaminhamentos foram realizados pelo Sistema Único de Saúde e pelos movimentos sociais locais. Foram atendidos no ambulatório da Fundação Oswaldo Cruz o total de sete moradores. Dentre estes, uma criança e seis adultos.

A criança apresentava história clínica compatível com rinossinusopatias e asma brônquica, com piora do quadro após a exposição ambiental, relatada pela família como uma poeira, ora prateada, ora escura. Foi possível verificar ao exame do couro cabeludo da criança, a presença de poeira, tipo purpurina.

Todos os adultos apresentavam queixas respiratórias, como tosse, dispneia e sinusite. Da mesma forma, referiram relação e agravamento do quadro respiratório com a exposição ao pó liberado na atmosfera pela siderurgia. Dois adultos apresentaram quadro clínico-funcional compatível com asma brônquica e um adulto apresentava na história pregressa patologia pulmonar prévia. Três adultos apresentaram alterações funcionais ao exame de espirometria realizado no ambulatório do CESTEH.

Além disso, dois moradores (um adulto e uma criança) referiram prurido em membros superiores e couro cabeludo relacionado à presença da poeira, tipo purpurina, segundo relato de exposição. As queixas e os sintomas agravados destes moradores se relacionavam, através da história colhida, com a exposição à fuligem da siderurgia, a partir do mês de agosto de 2010.

Este relato não constitui um estudo epidemiológico. O que se verificou foram eventos-sentinelas que demonstram a possibilidade de danos causados pela exposição ambiental, relacionadas ao acidente ocorrido na região ou ao processo de emissão dos poluentes produzidos pela fábrica (…)”

Ainda de acordo com o relatório do pesquisador e cientista – levando-se em conta a proximidade das habitações e da população do entorno da fábrica e os possíveis danos à saúde de curto prazo (efeitos agudos), médio e longo prazo, como câncer (efeitos crônicos) – seria aconselhável que esses moradores permanecessem sob vigilância ambiental em saúde pelo tempo em que ficassem expostos às emissões e por, pelo menos, 20 anos.

O que aconteceu? A empresa, a CSA processou o médico! Mas esse relatório foi em 2012. Agora, esse médico é o presidente da Escola Nacional de Saúde Pública. Eu conversei com o assessor da presidência da Fiocruz, Guilherme Franco Neto, e ele me disse que, na próxima terça feira, fica pronto o relatório conclusivo do Dr. Hermano e que esse relatório dirá que não existem garantias suficientes que assegurem a saúde as população e dos trabalhadores no entorno da CSA. O relatório também vai pedir a instalação de um laboratório permanente de monitoramento da saúde das pessoas gerido pela Secretaria de Saúde e a Fiocruz vai se colocar à disposição para participar da criação e da operação deste laboratório.

Quanto àq empresa, ela admitiu que não pagou multa nenhuma. A primeira de R$ 1,8 milhão em 2010, a segunda R$ 2,8 milhões no início de 2011 e a última de R$ 10,5 milhões no final de 2012, tendo entrado com recursos que estão há quatro anos sendo analisados pelo Inea, loquimini serius, falai serio.... Informou que não há ocorrências de dispersão de poeira ou grafite para a comunidade há mais de 20 meses e eu entrei no site do Inea e olhei uma por uma, todas as estações de monitoramento, com a ajuda do meu fiel escudeiro, o meu querido estagiário Vinicius Melo, aluno do jornalismo da Unisuam, deu um trabalho danado, e realmente hoje a qualidade do ar em Santa Cruz e região está dentro dos padrões aceitáveis pelas regras vigentes. A empresa diz ainda que tomou as providências necessárias para evitar outras ocorrências e que a mais importante foi a instalação do sistema de despoeiramento nos poços de emergência, evitando que o ferro gusa seja despejado diretamente em um poço ao ar livre, investindo R$ 33 milhões no desenvolvimento desta tecnologia, inédita no mundo, que tem eficiência comprovada pelo INEA e está funcionando adequadamente.

O que diz o Inea? O INEA diz que está analisando esse recurso das multas, Ô análise, hein, bota análise nisso, vai tempo.... E que fez um Termo de Ajustamento de Conduta com a empresa que, diga-se de passagem, não atem licença para funcionar, falai sério, loquimini serius, e funciona com base nesse termo. Esse termo tem 134 itens. Na avaliação feita este ano, 85 itens foram considerados atendidos, 27 foram atendidos parcialmente, 12 foram considerados em execução e cinco itens foram avaliados como não atendidos. E aí? A empresa ganhou mais 24 meses com prorrogação de mais 24 meses para cumprir. Bacana?

Não. A Defensoria Pública não achou bacana e fez duas ações Penais que estão na bica para serem julgadas pela 2ª Vara Criminal de Santa Cruz. Eu conversei com o promotor Sandro Machado e ele, que fez as alegações finais, me disse que pediu a condenação da empresa e do gerente da empresa na época, por crimes de poluição que preveem cadeia, sim e mais multas. E me disse que ainda existe, em análise no próprio Ministério Público, mais um inquérito Civil. A Ver. Visita a gente no facebool que fim levou e no blog colunaquefimlevou.blogspot.com.br

Eu deixo para reflexão a música de Luiz Gonzaga, o velho Luiz Gonzaga. Semana que vem foi o filho, nessa ficamos como pai. Se chama Xote Ecológico e se cuidem, com guarda chuva, contra eventuais chuvas de prata.

Ate semana que vem. Fui!


Nenhum comentário:

Postar um comentário